Nove riscos que os mercados terão de enfrentar em 2019

A imagem idílica que tem vindo a caracterizar a evolução dos mercados financeiros mundiais nos últimos anos tem os dias contados. No ano passado, episódios como o que ocorreu em fevereiro ou mesmo as fortes descidas dos últimos meses já se afiguravam como sinais de alerta difíceis de ignorar para os investidores; no entanto, 2019 será a verdadeira prova de fogo,o ano em que os investidores assumirão que a volatilidade veio para ficar e que o cenário de crescimento generalizado dos mercados financeiros – a nível geográfico e de ativos – será cada vez menos frequente. O mar pacífico dará lugar à ondulação, num contexto de desaceleração e dessincronização macroeconómica, com alguns bancos centrais a decidirem mudar as suas políticas… o que representa o fim das oportunidades para os investidores. Nada menos do que isso.

Entretanto, para conseguir manter-se à tona nestas águas mais bravias, terá de estar atento e ter em conta alguns riscos que já estão em cima da mesa. A carta náutica para este ano obriga a acompanhar de perto alguns aspetos como uma conjuntura mais próxima da recessão, com medidas importantes a serem tomadas pelos bancos centrais e uma guerra comercial em suspenso… por enquanto. Os riscos políticos e o aumento do populismo a nível mundial, que alimenta os movimentos protecionistas face à globalização, constituem uma forte ameaça para os mercados, que também terão que lidar em 2019 com um Brexit incerto e com um mundo emergente em alerta perante a subida das taxas nos EUA. A volatilidade das moedas e das matérias-primas deixará também a sua marca num ano em que faria sentido adotar posições mais táticas, pois parece evidente que os mercados se defrontam com um 2019 mais instável e de grandes desafios, tanto para o rendimento variável como para o rendimento fixo. Desafios que, além do mais, surpreenderam os mercados financeiros com avaliações muito ajustadas, ou seja, com pouca capacidade para amortecer estes nove eventuais “abalos” que destacamos.

Um crescimento menor e mais desajustado. O ciclo atual parece ser duradouro,mas os ciclos não morrem de velhos. Nesse sentido, parece claro que 2019 não trará uma recessão, mas sim uma clara desaceleração económica, com um crescimento global pouco acima dos 3%. Mais importante ainda: um contexto de dessincronização mundial, quando já nos havíamos habituado a um crescimento muito mais compassado. Os Estados Unidos continuarão a liderar os índices, enquanto a Europa e o resto do mundo ficarão mais atrasados, embora aumentem as advertências acerca do culminar do ciclo no gigante americano, cujos mercados se viram impulsionados pelas valências tecnológicas – as FAANG – que se revelam indestrutíveis. Esta economia terá que demonstrar a sua força sem os impulsos monetários ou fiscais que a sustentaram no passado, e os seus índices voltarão a afetar inevitavelmente todos os restantes países.

Inflação e retirada de estímulos por parte dos bancos centrais. As autoridades monetárias, que nos últimos anos têm impulsionado artificialmente os preços dos ativos financeiros graças à manutenção de algumas taxas próximas de zero e dos seus programas de compra da dívida, estão a sair de cena, enquanto a inflação renasce. No entanto, há o risco de estas políticas travarem o investimento, prejudicarem as empresas mais endividadas e provocarem uma descida dos níveis de confiança e do consumo. . Assim, os erros relacionados com políticas monetárias constituem um dos riscos mais importantes para os mercados. A Fed já subiu as suas taxas quatro vezes em 2018, em resposta ao crescimento económico, aos índices de emprego e à inflação (tanto nos salários como noutros custos, devido às novas políticas de tarifas), e tudo aponta para que as subidas continuem este ano. Na Europa, o BCE pôs fim ao seu programa de compra da dívida, mas não tocará nas taxas pelo menos até ao verão, enquanto o Banco do Japão já efetuou certos ajustes e o mundo emergente se adapta a uma situação heterogénea, com medidas díspares.

Neste contexto de normalização monetária generalizada, a chave será o ritmo e a capacidade com que as entidades se adaptam ao ambiente de crescimento e de inflação, ao invés de se anteciparem a ele. Tudo aponta para que as políticas monetárias continuem a ser ajustáveis , se bem que o seu apoio ao impulso económico seja menor.

Mercados de renda fixa sob pressão. Mesmo assim, as políticas de normalização dos bancos centrais colocarão os mercados de renda fixa sob uma forte pressão, o que poderá traduzir-se também nas bolsas se os investidores encararem a dívida como sendo agressiva. A menor liquidez, fruto da retirada dos programas de compra da dívida, também será um aspeto chave a ter em conta. Não nos podemos esquecer que a economia global caminha no sentido de se confrontar com um nível de endividamento preocupante.

Guerra comercial entre os EUA e a China. Uma das grandes incógnitas será a deriva protecionista do mundo, com estes dois gigantes como protagonistas e que, em 2018, já tinha dado provas de ser uma forte ameaça capaz de provocar uma recessão mundial. Será que as tréguas comerciais resultantes da cimeira do G20 manter-se-ão ao longo do tempo? É esta a pergunta do milhão de dólares, num contexto de desavenças, declarações e ações políticas por vezes pouco fiáveis.

Brexit: história de uma rutura marcada pela incerteza. A decisão do Reino Unido de sair da União Europeia está a criar uma enorme incerteza não só nos mercados, mas também no futuro dos líderes políticos, nomeadamente no que concerne ao governo de Theresa May. Existe o risco de as negociações fracassarem, o que aumentaria as probabilidades de um divórcio sem acordo, isto é, um Brexit duro que poderia ter um impacto negativo nas relações comerciais entre o Reino Unido e a zona euro, afetando o crescimento económico.

Menor crescimento na Europa. De facto, o menor crescimento do Velho Continente é um dos cenários que se prepara para este ano, sobretudo em países como a Alemanha –uma locomotiva a dar sinais de desaceleração – ou a Itália, em disputas constantes com a União Europeia por causa do seu orçamento, o que coloca em evidência a falta de estabilidade estrutural da zona euro. Os riscos de rutura podem manter-se se não se avançar para um processo de integração.

A ameaça do populismo. Entretanto, o populismo ganha força e avança a passos gigantes… na Europa, precisamente perante o descontentamento com as políticas comunitárias e outros pontos de divergência, como a emigração. Países como a Alemanha, França, Bélgica, Itália e Espanha terão como desafio barrar estes movimentos já assentes nos EUA e ainda mais recorrentes na América Latina, com novos expoentes no poder, como Bolsonaro no Brazil ou López Obrador no México.

O efeito desestabilizador dos mercados emergentes. O agravamento das condições de financiamento face à subida das taxas nos EUA e à força do dólar, bem como a situação económica nalguns países desenvolvidos, também representam um grande risco para os mercados globais em 2019. Já o vimos em 2018, com a crise a atingir os mercados e as moedas da África do Sul, Turquia ou Argentina, por vezes estimuladas por incertezas políticas – este ano, países como a Argentina irão a eleições – e intermináveis escândalos de corrupção, com os quais os mercados saem fragilizados.

Petróleo mais barato. O preço do petróleo também tem descido consideravelmente desde que atingiu máximos de quatro anos em outubro do ano passado: as tensões geopolíticas entre os EUA e o Irão, bem como as acrobacias empreendidas pela Arábia Saudita para manter os preços, continuarão a deixar em aberto um capítulo determinante para o crescimento mundial e para a evolução dos mercados.

Diz-se que o maior risco é aquele que não se pode prever, aquele que ainda não se consegue distinguir e que se mantém invisível aos olhos do investidor, explodindo repentinamente e sem aviso prévio. Esperemos que 2019 não traga abalos negativos e nos surpreenda com uma mudança de rumo nas ameaças assinaladas: se o discurso da guerra comercial se suavizar; se o Brexit tiver um bom desfecho para ambas as partes; se os riscos políticos desaparecerem na Europa e o populismo reduzir a sua presença no mundo… estes fatores poderão transformar-se em fatores de impulso económico, em ventos favoráveis e em catalisadores dos mercados financeiros. Esperam-se vaivéns, mas não necessariamente descidas. Com os mercados, nunca se sabe.

Alicia Miguel Serrano é chefe de redação da Funds Society e especialista em fundos de investimento.
É colaboradora habitual da revista Inversión y Finanzas, tendo trabalhado no Funds People e na Graceta de los Negocios.